Governo quer voltar a taxar alimentos e, em troca, oferecer créditos no cartão da Bolsa Família
A proposta do governo de dar fim à desoneração da cesta básica pode encarecer o conjunto de produtos considerados essenciais em cerca de 20% no país, segundo dados do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT). Para especialistas, a medida pode prejudicar principalmente as famílias mais pobres, além de encarecer a alimentação fora do lar e elevar a inflação.
Em Belo Horizonte, o valor da cesta básica subiu 7,25% nos últimos 12 meses e, em outubro, segundo a última pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (Ipead-MG), alcançou o valor de R$ 421,21 – mais de 42% do salário mínimo.
“A desoneração e o consequente aumento dos itens da cesta vão comprometer ainda mais a renda e o poder de compra das famílias”, afirma a coordenadora de pesquisas do instituto, Thaize Martins, ressaltando que o valor do quilo e do prato feito em restaurantes também pode crescer. “Embora a inflação tenha itens com pesos maiores, como o custo com educação, impostos e combustível, o aumento dos itens alimentares também pode gerar alta”, explica.
Desde 2004, produtos como feijão, arroz, pão, leite e queijos são isentos de PIS/Cofins e, nos últimos anos, diversos decretos ampliaram o rol de itens com alíquota zero. O novo modelo, ainda em discussão no governo, prevê que esse benefício seja alcançado somente pela população que recebe o Bolsa Família.
O programa atende famílias que vivem em situação de pobreza extrema, com renda per capita de até R$ 89 por mês e de pobreza, com renda entre R$ 89,01 e R$ 178. A ideia é que o valor correspondente à devolução dos impostos sobre a cesta básica seja resgatado no cartão que os beneficiários utilizam para receber o dinheiro.
No entanto, conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), 60% dos trabalhadores com os menores rendimentos receberam, em média, R$ 928 mensais em 2018, valor inferior ao salário mínimo e superior ao limite para recebimento do Bolsa Família.
Na avaliação do presidente do IBPT, João Eloi Olenike, a proposta é inadequada. “O argumento do governo é que os itens estão sendo consumidos pela classe média, e não pelas pessoas de renda menor. Mas é mais fácil trocar esses itens por outros imprescindíveis do que voltar a onerar e tentar, via Bolsa Família, recompensar a classe mais baixa. Acho muito difícil isso, está muito sujeito a esquemas feitos por pessoas que não têm o direito e acabam burlando. A medida não é boa nem popular”, diz.
O economista e professor do Ibmec Felipe Leroy espera que a medida seja revista. “O aumento da cesta básica em 20% tem impacto direto no orçamento das famílias de baixa renda e é preocupante, porque são itens de primeira necessidade”, diz. “Nós chegamos a um ponto em que não adianta aumentar a carga tributária para elevar a arrecadação. O índice de sonegação tem aumentado significativamente porque as famílias e as empresas não estão dando conta de pagar imposto”, avalia Leroy.
(Com agências).
Fonte: Jornal O Tempo – Publicado em 30/11/2019 por Rafaela Mansur.