Adicional nas contas de energia neste mês e a pressão das compras de fim de ano elevam previsão para o IPCA acima de 4% neste ano
Os analistas de bancos e corretoras precificaram a mudança tarifária que vai encarecer a conta de energia elétrica este mês nas revisões para inflação mais alta do que era esperado em 2020 e, agora, acima da meta projetada pelo Banco Central (BC) no ano. As expectativas para a inflação oficial do país que o BC inclui no chamado Boletim Focus, com a opinião de uma centena de analistas do mercado financeiro, subiram de 3,54% para 4,21%. A mudança só confirma a pressão maior do custo de vida para as famílias em dezembro, mês de tradicionais aumentos de preços influenciados pela demanda do Natal, e num ano marcado pela pandemia do novo coronavírus.
A nova projeção do mercado financeiro para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), supera o centro da meta da inflação, de 4%. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou a retomada da bandeira tarifária vermelha na conta de luz a partir de dezembro. O sistema de bandeiras tarifárias havia sido suspenso em maio devido à pandemia, e a agência reguladora havia acionado a bandeira verde, sem cobrança de taxa extra.
Com isso, o índice indicado para dezembro ficou em 1,17%, bem acima do percentual de 0,67% projetado há uma semana no boletim. Segundo o relatório, a inflação de novembro, que será divulgada hoje pelo IBGE, deve ficar em 0,77%, abaixo do índice calculado em outubro, O economista André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fundação Getulio Vargas (FGV), avalia que ao longo de 2020 o maior desafio para a inflação veio dos alimentos, que respondem por mais de 70% da inflação acumulada de 2020. Para Braz, apesar de o peso dos alimentos ser pequeno no orçamento das famílias, cerca de apenas 13%, a variação foi tão alta, que fez com ela respondesse majoritariamente pelo IPCA observado.
O impacto da conta de energia mais cara neste mês será significativo, segundo André Braz. “Não vai ser uma aceleração qualquer, mas um aumento bem expressivo”, observa. “Se em agosto ou setembro você questionasse os analistas sobre o que esperavam para a inflação de 2020, era algo em torno de 2%. E como em setembro a gente teve uma nova rodada de aumento no preço dos alimentos, que se perdurou pelo menos até novembro, a expectativa de inflação deste ano se aproximou da meta. Então, antes de a gente saber do impacto da bandeira tarifária, o mercado reviu a conta e a expectativa de inflação era em torno de 3,5%”.
Segundo o economista da FGV, a escalada no preço dos alimentos se acentuou em setembro, quando os economistas previam que a alimentação começaria a ceder, mas o movimento observado foi o oposto. Braz atribui a inflação no preço dos alimentos ao novo ciclo de desvalorização cambial, em que o real se enfraqueceu mais, e também ao aumento do preço em dólar de várias commodities. “Esses dois movimentos já vinham acelerando as expectativas de inflação pra 2020 sem que a gente levasse em conta a mudança da bandeira tarifária”, observa.
Câmbio e renda Para Thaize Martins, mestre em estatística e coordenadora de pesquisa e desenvolvimento da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas, Administrativas e Contábeis de Minas Gerais (Ipead/UFMG), a pandemia de COVID-19 interferiu radicalmente na lógica de preços neste ano. Ela também atribui o aumento à valorização do dólar, que contribuiu para o aumento das exportações, já que produtores destinaram às exportações a produção que antes atenderia às necessidades internas. Os casos do arroz e das carnes são exemplos que a pesquisadora cita ente os produtos que pressionaram a inflação.
“É um conjunto de fatores que vêm pressionando a inflação desde o início da pandemia”, afirma Thaize, que destaca ainda a interferência das condições climáticas fora do padrão observadas no decorrer do ano, como o recorde de temperatura em novembro.
O custo de vida medido em Belo Horizonte no mês passado pelo Fundação Ipead subiu 0,61% em relação ao mês anterior. O cálculo é obtido a partir da pesquisa de variação de preços de produtos e serviços, com base no IPCA. “É um ano em que está coincidindo alta nos preços e diminuição na renda”, constata Thaize Martins.
Fonte: Jornal Estado de Minas – Publicado em 08/12/2020 por Marco Faleiro.