Tarifa aumentou de R$ 3,90 para R$ 5,70 no domingo e R$ 1,80 a mais no preço da passagem compromete a renda de quem viaja todos os dias
O eletricista Márcio Adriano da Silva, de 51 anos, embarca 22 vezes por mês na rodoviária de Belo Horizonte para prestar serviços em Capim Branco, na região Central do Minas, e no Instituto Inhotim, em Brumadinho, na região metropolitana. Com o aumento de 46% da tarifa de embarque do terminal rodoviário, que no domingo subiu de R$ 3,90 para R$ 5,70, o orçamento mensal do eletricista está comprometido em R$ 39,20, por ele ter que pagar R$ 1,80 a mais em cada passagem.
“Eu compraria uma caixa de leite com essa diferença, ou completaria para pagar a conta de luz. Um pacote de arroz custa R$ 10. Eu compraria três sacos de arroz e ainda sobraria uma merreca”, reclama o eletricista.
Para a coordenadora de pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas Administrativas Contábeis de Minas Gerais (Ipead), Thaíze Martins, esse aumento é considerável e vai afetar o público que necessita dessa quantia para outras despesas e que necessita do transporte de forma rotineira. “Para o consumidor amplo, que é o que a gente considera na inflação, esse reajuste, por mais que ele tenha sido considerável, não traz impacto para a inflação da cidade. Mas, para quem faz esse uso diariamente ou semanalmente (do transporte rodoviário), com certeza tem um impacto no orçamento e a família precisa incluir esse gasto e reorganizar a sua planilha”, orienta a especialista.
“É um sacolão de uma semana, por exemplo, uma compra no açougue. O orçamento vai ficar comprometido por ter que destinar o recurso a essa tarifa”, ressalta a especialista.
Infraestrutura
O aumento da tarifa de embarque é para as viagens intermunicipais, interestaduais e de oito linhas metropolitanas com embarques nas plataformas do terminal, entre elas Inhotim e Aeroporto Internacional Tancredo Neves, em Confins.
O reajuste anterior havia sido em março do ano passado, de apenas R$ 0,20, quando passou de R$ 3,70 para R$ 3,90.
Na época, houve a unificação da taxa de embarque, que, segundo a Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemge), que administra a rodoviária, é estipulada tendo como base a utilização da infraestrutura disponível na rodoviária, e não a distância entre a capital e o destino final da viagem, como vinha sendo praticado até então.
“A atualização da tarifa de embarque busca gerar receitas para cobrir as despesas necessárias à operação e à manutenção do empreendimento”, justificou a Codemge, lembrando que o uso do banheiro é gratuito para quem compra passagem.
Revolta
A reação da empregada doméstica Ana Lúcia Mendes, de 59 anos, que viajou para Piedade dos Gerais, na região Central, foi de revolta quando soube do aumento. “Um absurdo. O salário não tem aumento e eles estão aumentando tudo. Paguei R$ 48 da outra vez e, agora, paguei R$ 50”, reagiu Ana Lúcia. “Com R$ 1,80 dava para comer uma empada durante a viagem. Agora, só vou comer quando chegar em casa”, reclamou.
O operador de máquinas pesadas João Soares de Oliveira, de 75 anos, viajou para Brasília de Minas, no Norte do Estado, e também não se conformou com o reajuste.
“A gente não tem esse repasse no nosso salário. Juntando R$ 1,80 com R$ 1,80 é como o ditado que fala que a galinha de grão em grão enche o papo. Quando pensa que não, já foi um quilo de milho, né?”, reagiu o operador de máquinas. “E o nosso salário, nada. Miudinho, miudinho”, reclamou. “É muito abuso esse aumento. Eles aproveitam da classe pequena”, reforçou.
Clandestino
O estudante Bruno Valadares, de 23 anos, preferiu se arriscar e viajar para Sete Lagoas, na região Central de Minas, em um veículo clandestino. “Essa diferença de R$ 1,80 faz muita diferença no bolso para quem sempre está indo e voltando”, disse Bruno. Com R$ 1,80, ele disse ter comprado um pão de queijo e uma paçoquinha.
Ao contrário do estudante, a pedagoga Maria José Parente, de 71 anos, que viaja a cada 15 dias para Sete Lagoas, preferiu pagar a passagem com aumento e viajar com segurança. “Um motorista clandestino me abordou ali agora e eu não fui. Eu não sei quem ele é”, justificou. “O vencimento nosso não aumentou e os serviços prestados são os mesmos. Então, não tem sentido esse aumento da taxa de embarque”, reclamou.
Perigo
O Departamento de Edificações e Estradas de Rodagens de Minas Gerais (DEER/MG) alerta para os riscos de viajar em veículos Clandestinos. “A utilização do transporte clandestino implica em riscos para o passageiro, já que é um transporte que não oferece segurança, veículos sem vistoria, motoristas despreparados, viagens sem seguro de vida para o passageiro e com risco de interrupção devido às ações de fiscalização”, alerta.
O transporte clandestino é feito em ônibus, microônibus, vans, táxis e carros particulares. Segundo o DEER/MG, as fiscalizações são feitas de forma rotineira.
Fonte: Jornal O Tempo – Publicado em 03/03/2020 por Pedro Ferreira.